História da Química dos Compostos Organometálicos. História do Ferroceno e Compostos Relacionados.


Ferroceno
Estrutura Química do Organometálico Ferroceno. Fonte da Imagem: VISCONTI, P.; PRIMICERI, P.; LONGO, D.; STRAFELLA, L. Beilstein J. Nanotech, 134 (2017).

Autoria: Alberto Federman Neto, AFNTECH.

Revisto e Ampliado em 23 de Novembro de 2022.

1. INTRODUÇÃO:

O assunto é a Química Organometálica, minha principal especialidade de pesquisa e assunto de minha Tese de Doutorado.

Neste Artigo, História da Química dos Compostos Organometálicos em geral e História do Ferroceno.

2. HISTÓRIA DOS COMPOSTOS ORGANOMETÁLICOS EM GERAL:

Em 1757, o Farmacêutico e Químico Francês Louis Claude Cadet de Gassicourt  preparou o “Líquido Fumegante de Cadet“, uma mistura de compostos “organometálicos”…. DORVEAUX, P.  Rev. Hist. Pharm. 88, 385 (1934). THAYER, J.S. Adv. Organomet. Chem. 13, 1 (1975).

CADET DE GASSICOURT, C. ” Suite d’Expériences nouvelles sur l’Encre sympathique de M. Hellot, qui peuvent servir à l’analyse du Cobolt; et Historie d’une liqueur fumante , tirée de l’Arsènic.” ,  Mem. Mat. Phys Acad Roy Scienc. 13, 623 (1760).

Em seus estudos sobre o acetato de potássio, Cadet  aqueceu o arsênico, As2O3, com o acetato de potássio, e obteve uma mistura de óxido de cacodilo e “Cacodilatos“. WISNIAK, J.  Rev. CENIC Cienc. Quím. 42, 1 (2011).

4 KCH3COO + As2O3 → ((CH3)2As)2O + 2 K2CO3 + 2 CO2

Cadodilato de Sódio, Dimetil Arseniato de Sódio.

Eram na realidade, compostos organoarsênio,… Não eram “organometálicos” exatamente, mas organo metalóides, organosemimetais.

“Compostos Organoelemento”, na definição do Químico Soviético Alexander Nikolaevich Nesmeyanov, CARREIRA, E.M. Et Al. Org. Lett. 22, 765 (2020).

Pois o arsênio é um semimetal, um metalóide, e não um metal, propriamente dito. SEYFERTH, D. Organomettalics,  20, 1488 (2001).

NESMEYANOV, A.N.; BIRRON, A.;  COLE, Z.S. (Tradutores); GELFAND, D.P (Editor), “Selected Works in Organic Chemistry.” Editoras: Pergamon Press, Oxford, Inglaterra e Jerusalem Academic Press, Jerusalém, Israel, Pág. 753 (1963).

O óxido de cacodilo e os cacodilatos foram muito estudados e reconhecidos como organoarsênio, pelo Químico Alemão Robert Wilhelm Eberhard Bunsen. (o mesmo do conhecido Bico de Bunsen). Citado por: THAYER, J.S. J. Chem. Educ.   43, 594 (1966). NICHOLSON, J. (2007).

Pesquisa perigosa, pois essas arsinas são muito venenosas, e algumas, pirofóricas.

O primeiro verdadeiro organometálico, contendo ligação direta entre um  metal e uma estrutura orgânica, foi o “Sal de Zeize“.  (publicado em 1831). Obtido de álcool comum e cloroplatinato de potássio.

Tricloroetileno platinato (II) de potássio. Do Farmacêutico, Químico e Filósofo Natural Dinamarquês William Christopher Zeise. ZEIZE, W.C. Ann. Phys. Chem. 497 (1831) .

Sal de Zeize. Tricloroetileno Platinato (II) de Potássio.

 

 Entretanto, Zeize  havia já obtido o composto em 1825 e 1827, publicado em periódicos regionais. SEYFERTH, D. Organometallics, 20, 2 (2001).

A estrutura contendo etileno diretamente como ligante de coordenação, permaneceu duvidosa por muitos anos, até ser confirmada na década de  50.  E depois por uma preparação inequívoca, partindo de etileno, em 1973. CHOCK, P.B Et Al. Inorg. Synth. 14, 90 (1973).

Após o Sal de Zeize, a síntese dos compostos organometálicos verdadeiros, com ligação direta metal-carbono, foi progredindo lentamente.

O Químico Inglês Edward Frankland sintetizou os primeiros organometálicos verdadeiros. FRANKLAND, E. Ann. Chem. 85, 329 (1859).  Considerado o primeiro Químico Organometálico. Trabalhos.

De zinco. (1850-1860). FRANKLAND, E. Phil. Trans. 145, 259 (1855). FRANKLAND, E.  J. Prakt. Chem. 59, 208 (1853). De estanho (1852). FRANKLAND, E. Phil. Trans. 142, 417 (1852). Frankland também cita organoantimônio e organobismuto. Organoboro. Trabalhos de Frankland. FRANKLAND, E.; VAN VOORST, J. (Editor) “Experimental Researches in Pure, Applied and Physical Chemistry.” Londres, Inglaterra (1877).

Um composto organometálico de zinco representativo. Dietilzinco, (Et)2Zn, preparado tanto por Frankland, quanto por Gilman.  NOLLER, C.R.; GILMAN, H.; SOUTHGATE, H.A.; MEHLTRETTER, C. Org. Synth. 12, 86 (1932).

Organomercúrio (1852-1863). O primeiro composto obtido, iodeto de metilmercúrio.  FRANKLAND, E. Phil. Trans. Roy. Soc. Lond.  142, 417 (1852).  FRANKLAND, E.; DUPPA, B.F. J. Chem. Soc. 16,  415 (1863). Revisão: LAROCK, R.E.  “Organomercury Compounds in Organic Synthesis.” Editora Spring Verlag, Berlim, Alemanha (2012). LAROCK, R.C. Organic Syntheses (1985).

Os organomercúrio  arílicos, aromáticos. Embora houvessem sido preparados por Frankland a reação direta entre mercúrio metal e haletos de arila, não é fácil.

Uma outra aproximação para a síntese dos organomercúrio armáticos, foi seguida pelo Químico Alemão Otto Dimroth . A “Mercuração Eletrofílica de Dimroth” uma reação direta entre um composto arílico, aromático, e acetato de mercúrio (II). DIMROTH, O. Ber. Dtsch. Chem. Gessel.  31 2154 (1898)Texto Completo do Artigo. DIMROTH, O. Ber. Dtsch. Chem. Gessel, 35, 2853 (1902).

Embora a possibilidade da formação de uma ligação metal-carbonila, fosse antevista pelo Químico Francês Paul Schützenberger, SCHUTZENBERGER, P.  Lond. Edin. Dub. Phil. Mag. J. Scienc. 33, 140 (1867),…

Só por volta da mesma época das reações de Frankland e de Dimroth ( em 1890) , o Químico Alemão naturalizado Inglês, Ludwig Mond,  através da reação direta  dos respectivos metais, com monóxido de carbono, descobriu  e preparou um novo tipo de composto organometálico importante, os carbonilo metais…

Niquel tetracarbonilo, Ni(CO)4, MOND, L. LANGER, C.; QUINCKE, F. J. Chem. Soc. Trans. 57, 749 (1890),   e Ferro Pentacarbonilo. Fe(CO)5. MOND, L.. LANGER, C. J. Chem. Soc. Trans. 59, 1090 (1891). Revisão: TROUT, W.E. J. Chem.  Educ. 14, 453 (1937).

Em 1900, um marcoHistórico  da Química Organometálica. A descoberta  dos organomagnésio, dos importantíssimos “Reagentes de Grignard”, tão importantes em Síntese Orgânica, como na própria Química Organometálica.

Pelo Químico Francês Victor GrignardGRIGNARD, V.; Comp. Rend. Hebdo. Seanc. Acad. Scienc. 130, 1322 (1900) .

Grignard defenderia sua Tese de Doutorado sobre os organomagnésio,  GRIGNARD, V.; BARBIER, P.F. (Orientador), “Sur Les Combinasions Organomagnésiennes Mistesm et Leur Application  a des Synthèses a D’Acides, D’Alcools et D’Hydrocarbures.” Tese de Doutorado, Universidade de Lyon, Lyon, França (1901).

E receberia o Prêmio Nobel de Química em 1912, junto com Paul Sabatier.

Mas Grignard sempre citava seu Professor e Orientador, Philippe Antoine Francoise Barbier , como o verdadeiro descobridor dos reagentes organomagnésio, um ano antes. BARBIER, P. Compt. Rend. Hebd. Seanc. Acad. Scienc.  129, 110 (1899).

Outro importante tipo de organometálico. Hoje são comerciais e muito usados em Síntese Orgânica. Os organolítio. Descobertos pelo Químico Alemão Wilhelm Johann Schlenk. SCHLENK, E. HOLTZ, J. Ber. Dtsch. Chem. Gessel. 50, 262 (1917). WIETELMANN. U.; KLETT, J. Zeit. Anorg. Allg. Chem. 644, 194 (2018).

Schlenk também sintetizou o fenillítio a alguns organosódio.

Embora descobertos em 1917, os compostos organolítio (e os organocobre, “Reagentes de Gilman”) foram muito estudados e aperfeiçoados a partir dos anos 30, pelo Químico Americano Henry Gilman. Há muitas publicações. Outro Link. Ex. GILMAN, H.; ZOELLNER, E.A.; SELBY, H.M. J. Am. Chem. Soc. 54 ,  1957 (1932).

O mais importante organolítio é o n-butillítio, BuLi, cuja síntese (preparação), foi otimizada por Ziegler  e depois, por Gilman. ZIEGLER, K.; COLONIUS, H. Justus Liebig’s Ann. Chem. 479, 135 (1930). GILMAN. H. Et Al. J. Am. Chem. Soc. 71, 1499 (1949). É extremamente útil em Química Organometálica e Orgânica, e hoje se compra, comercialmente, diluído em diversos solventes.

Existem outros organometálicos importantes do ponto de vista Químico e Histórico.

O chumbo tetraetila, Pb(Et)4, sintetizado em laboratório pela primeira vez pelo Químico e Entomologista Inglês George Bowdler Buckton  . BUCKTON,G.B.    Justus Liebig’s Ann. Chem. 109, 2818 (1859). BUCKTON, G.B. Proc. Roy. Soc. London, 9, 309 (1859). GILMAN, H.. ROBINSON, J.D. J. Chem. Soc. 1975 (1930).

E introduzido como antidetonante em gasolina, em 1921.  LOEB, A.P. Bus. Econon. Hist. 24,72 (1995). NICKERSON, S.P. J. Chem. Educ. 31, 560 (1954)SEYFERTH, D. Organometallics,   22, 5154 (2003). Ibid. 2346 (2003).

Foi banido em todos os Países, entre 1980 e 1993, por ser muito tóxico, além de seus resíduos de combustão, poluentes.  FONSECA, T.M.; McKINLEY, G.P.; KENNEDY, S.H. Psyc. Res. 251, 253 (2017).

Importantes também os organoalumínio, reagentes para fazer os catalisadores de polimerização de olefinas, “Catalisadores de Ziegler-Natta“. Do Alemão Karl Wlademar Ziegler   ZIEGLER, K.W. Et Al. Patente Alemã DE973326 (1953-1960) ,  e do Italiano Giulio NattaNATTA, G. Et Al. J. Am. Chem. Soc. 77, 1798 (1955). Prêmio Nobel de Química de 1963, para Ziegler & Natta.

Os organoalumínio foram descobertos por  Hallwachs & Schafarlk. HALLWACHS, W.; SCHAFARIK, A.  Justus Liebig’s Ann. Chem. 109, 206 (1859).

Outro destaque. Iodeto de etilmercúrio, EtHgI  . MAYNARD, J.L. J. Am. Chem Soc. 54, 2108 (1932). CHAPMAN, E.T. J. Chem. Soc. 19, 150 (1866). Outros métodos de síntese.

Eu preparei várias vezes esse composto. Ele era intermediário na síntese  do antigo antisséptico Timerosal. Ele próprio foi usado como antisséptico, antes do Timerosal. LAMMERTS, W.E. Phytop. 30, 334 (1940).

O Timerosal, Merthiolate, foi um importante organometálico de mercúrio, que foi muito usado como antisséptico, e desenvolvido pelo  famoso Químico Russo, naturalizado Americano, Morris Selig Kharasch e patenteado pela Eli Lilly Co., Indiana, EUA. KHARASCH, M.S. Patente Americana, 1672615A (1927-1929) É tóxico e não é usado mais.

Eu estudei a síntese de Timerosal e obtinha  iodeto ou brometo de etilmercúrio por este método,  ou às vezes, usando brometo de etilmagnésio e cloreto de mercúrio (II).

 EtI   +     Mg   =    EtMgI

  EtMgI  +  HgI2   =  EtHgI   +  MgI2

Outro importante organometálico que foi usado como antisséptico, o Mercúriocromo ou Merbromino. introduzido na Terapêutica  em 1919. YOUNG, H.H.; WHITE, E,C.; SWARTZ, E.O., J. Am. Med. Assoc. 73, 1483 (1919)  . Link para Texto Completo. WHITE, E.C. J. Am. Chem. Soc. 42, 2355 (1920).

Abaixo, as estruturas químicas do Merthiolate e do Mercúriocromo. Note a ligação metla-carbono, que os caracteriza como verdadeiros organometálicos.

Timerosal ou Merthiolate.
Timerosal ou Merthiolate.
Mercúriocromo ou Merbromino.
Mercúriocromo ou Merbromino.

Com isso, vimos a História resumida da Química Organometálica e alguns do s compostos representativos. Nos dias atuais, há práticamente organometálicos de todos os metais.

3. HISTÓRIA DO FERROCENO E COMPOSTOS RELACIONADOS :

A Química do Ferroceno é minha principal  especialidade de pesquisa e assunto da minha Tese de Doutorado. A imagem que ilustra este artigo é a estrutura química do ferroceno, bis(ciclopentadienil) ferro, (C5H5)2Fe.

FEDERMAN NETO, A.; MILLER, J. (Orientador); BONILHA, J. ; MARCONDES, M.E.R.; OLIVATO, P. ; VICHI, E.J.S (Examinadores) “Síntese e Reatividade de Complexos de Ferro, com Ligantes Homocíclicos de Caráter Aromático.” Tese de Doutorado em Ciências, Modalidade Química Orgânica. Departamento de Química Fundamental, Instituto de Química, Universidade de São Paulo, São Paulo, S.P. (1986).

A História do Ferroceno mostraria que o caráter aromático não se restringe aos compostos orgânicos. O átomo de metal de certos organometálicos pode participar de um sexteto aromático. CHEN, D.; XIE, Q.; ZHU, J. Acc. Chem. Res. 52, 1449 (2019). VÁRIOS AUTORES, “The Organic Chemistry of Ferrocene and Related Compounds.” em “Principles of Organometallic Chemistry.” Editora Springer, Dordrecht, Alemanha (1968) .

Em 1919, por reação entre cloreto de cromo (III) e um reagente de Grignard benzênico, brometo de fenilmagnésio,  o Químico Alemão Franz Hein, obteve uma mistura dos primeiros compostos organocromo, que supunha, tivessem ligação sigma Cr-C. HEIN, F.  Ber. Dtsch. Chem. Gessel. A & B,  52, 195 (1919).

Ao longo dos anos, e principalmente após a década de 50, o trabalho de vários pesquisadores mostraria que entretanto, esses compostos organocromo, tinham ligação π entre o metal e o carbono.  ROSENTHAL, U.; SCHULTZ, A. Eur. J. Inorg. Chem. e202100749 (2022). TSUTSUI, M.; ZEISS, H. J. Am. Chem. Soc. 81, 1367 (1959). HERWIG, W.; ZEISS, H.H. J. Am. Chem. Soc. 79, 6561 (1957). CUMMING, W.W. ; HORN, J.A.; RITCHIE, P.D. J. App. Chem. 2, 624 (1952). UHLIG, E. Organometallics, 12, 4751 (1993). Alguns poucos compostos organocromo são covalentes.

Em 1952, Kealy e Pauson, reagiram brometo de ciclopentadienil magnésio e cloreto ferroso, obtendo um novo composto organoferro, muito estável, com fórmula (C5H5)2Fe , ao qual atribuíram uma estrutura covalente ou iônica.  KEALY, T.J.; PAUSON, P.L. Nature, 168, 1039 (1952). Independentemente, por outro método, o mesmo composto foi obtido por Miller, Tebboth e Tremaine. MILLER, S.A.; TEBBOTH, J.A.; TREMAINE, 632 (1952). KAUFFMAN, G.B. J. Chem. Educ. 60, 185 (1983).

A notável estabilidade do bis(ciclopentadienil) ferro, Ferroceno, chamou a atenção da comunidade científica.

No mesmo ano, 1952, Woodward e col. descobriram o caráter aromático do composto e propuseram o nome Ferroceno. O composto dava reações de Friedel & Crafts, típica dos compostos aromáticos! WOODWARD, R.B.; ROSEMBLUM, M.; WHITING, M.C. J. Am. Chem. Soc. 74, 3458 (1952)

O mesmo grupo de pesquisa,  de  Rosemblum e Whiting, reforçado na época em Harvard, pelo Químico Inglês Geoffrey Wilkinson   confirmou uma estrutura chamada “Sandwich

Onde o caráter “olefínico” de cada um dos anéis ciclopentadienil (5 eletrons) era neutralizada por um cátion de ferro (0), portanto 5 elétrons, em cada anel, WILKINSON, G.; ROSEMBLUM, M.; WHITING, M.C. J. Am. Chem. Soc. 74, 2125 (1952). LANDSKRON, K. “Historical Background and Introduction into Metallocenes.” (2022).

Ou 6 eletrons em cada anel e um cátion de ferro (II), formando um sexteto aromático, veremos a seguir.

A estrutura aromática e simétrica, coordenada, “sandwich”, foi confirmada por Espectroscopia, por Dunitz e Orgel. DUNITZ, J.D.; ORGEL, L.E. Nature, 171, 121 (1953) . E depois, por cristalografia de RX. DUNITZ, J.D.; ORGEL, L.E.; RICH, A. Acta Cryst. 9, 373 (1956).

Ferroceno, Estrutura suposta como covalente.
Figura 1 – Estrutura Suposta Covalente, Inicialmente Proposta.

 

Ferroceno, Estrutura Iônica e Coordenada.
Figura 2 – Ferroceno, Estrutura Iônica e Coordenada.

Na Figura  1 acima, vê-se a estrutura covalente, inicialmente proposta. Figura 2, a direita, “Bisciclopentadieneto  de Ferro (II)”, estrutura iônica. Disso decorre que cada “ciclopentadieneto” doa 6 e-  a um cátion de ferro (II) (6 e-), ou 5 e-, a um átomo de ferro neutro…

Portanto resulta no Ferroceno Real (Veja Figura 2 a esquerda e Figura 3). Coordenado, é um complexo de coordenação entre um átomo de ferro (II) e dois ligantes ciclopentadienil.

Ferroceno, Modelo de Bola e Bastão.
Figura 3 – Ferroceno, Modelo de Bola e Bastão.

Tem caráter aromático, mais reativo que o benzeno e pode ser acilado, alquilado etc… É um verdadeiro “Benzeno Organometálico” ou Benzeno Inorgânico”. WERNER, H. Ang. Chem. Int. Ed. 51, 6052 (2012).

Para o ciclopentadienil, uma analogia simples para o leitor entender. Suponha um benzeno, que é aromático e tem 6 elétrons. Retire um carbono dele, mas mantenha o elétron. surge uma carga negativa formal. É o ligante ciclopentadienil. Aromático, tem 6 elétrons.

Coordenados ao ferro (II), 6 e-,  os ligantes ciclopentadienil são neutralizados. Ferroceno tem 18 elétrons ao redor do átomo de ferro. É aromático e muito estável.

Mas há atualmente, controvérsias sobre qual grupo de pesquisa teria descoberto com primazia o Ferroceno , sua estrutura e reatividade antes, pois os vários grupos se conheciam,  e trocavam amostras. LASZLO, P.; HOFMANN, R. Ang. Chem. Int. Ed. 39, 123 (2000). Para Wilkinson, a reação de Miller, Tebboth e Tremaine é 4 meses anterior ao trabalho de Pauson. WILKINSON, G. J. Organomet. Chem. 100, 273 (1975).

Em um exemplo, Acetilferroceno foi obtido oficialmente pela primeira vez por Weinmayr, em 1955. WEINMAYR, V. J. Am. Chem. Soc. 77, 3009 (1955). Pela acilação de Friedel & Crafts do ferroceno catalisada por ácido fluorídrico gasoso.

Mas Pauson afirmava já te-lo obtido antes. PAUSON, P.L. Quart. Rev. Chem. Soc. 9, 391 (1955) . BROADHEAD, G.D.; OSGERBY, J.M.; PAUSON, P.L J. Chem. Soc. 650 (1958). HAUSER, C.R.; LINDSAY, J.K. J. Org. Chem. 22, 482 (1957).

Acilação de ferroceno (acetilferroceno) catalisada por trifluoreto de boro eterato. BF3.Et2O. DONAHUE, C.J. ; DONAHUE, C.R. J. Chem. Educ. 90, 1688 (2013).

Estrutura tipo “Sanduíche”, como no Ferroceno, também é encontrada no Dibenzenocromo e seu cátion, moleculas sintetizadas em 1955, por reação entre cloreto de cromo (III) anidro, cloreto de alumínio e benzeno. Do Químico Alemão Ernest Otto Fischer . FISCHER, E.O.; HAFNER, W. Zeit. Naturforsch. 10B 665 (1955).  FISCHER,  E.O. ; HAFNER, W. Zeit. Anorg. Allg. Chem. 286, 146 (1956).

Fischer relacionou as estruturas “Sanduíche” do Ferroceno e do Dibenzenocromo, e descobriu  que o dibenzenocromo também é aromático. FRITZ, H.P.;  FISCHER, E..O. Zeit. Naturforsch. 12B, 67 (1957). E confirmou que ambos, Ferroceno e Dibenzenocromo, são compostos “Sanduíche”. FISCHER, E.O.; FRITZ, H.P. Adv. Inorg. Chem. Radiochem. 1, 55 (1959).

Estruturas Sanduíche do Ferroceno e do Dibenzenocromo.
Estruturas Sanduíche do Ferroceno e do Dibenzenocromo. Analogia Estrutural e Modelos de Bola e Bastão.

Na realidade Fischer  não concordava exatamente com Pauson e Wilkinson, de que Ferroceno fosse Sanduíche puro, como o DibenzenocromoFISCHER, E.K.; COTTON, F.A.; WILKINSON, G. J. Phys. Chem. 63, 154 (1959)WEISS, E.; FISCHER, E.O. Zeit. Anorg. Allg. Chem. 286, 142 (1956). FISCHER, E.O.; SEUS, D. Chem. Ber. 89, 1809 (1956).

Por causa do anel só ter 5 carbonos em Ferroceno. Fischer distribui a carga da nuvem eletrônica π aromática, como um “Duplo Cone“, em Alemão “Doppel Kegel“. FISCHER, E.O.  Zeit. Naturforsch. 9B, 619 (1954). FISCHER, E.O.; PFAB, W. Zeit. Naturforsch. 7B, 377 (1952). Veja também FISCHER, E.O., outros trabalhos citados aqui, Loc. Cit., FISCHER, E.O. Várias Referências.

Para Wilkinson, Cotton, Pauson, Rosenblum etc… no Ferroceno, cada ligante ciclopentadienil vai doar só 5 elétrons a um átomo de ferro metal (0), e não 6 elétrons π por anel, a um cátion de ferro (II) (modelo de Fischer). WILKINSON, ROSEMBLUM & WHITING, Loc Cit. (1955). ROSEMBLUM, M.;  ABBATE, F.W. J. Am. Chem. Soc. 88, 4178 (1966). RAUSCH, M.D.; FISCHER, E.O.; GRUBERT, H. J. Am. Chem. Soc. 82, 76 (1960). FISCHER, E.O.; FRITZ, H.P. Adv. Inorg. Chem. Radiochem. 1, 55 (1959).

Ocorre que o “Ferroceno de Wilkinson” não seria aromático, e sim olefínico! Veja: NESMEYANOV, A.N. Proc. Roy. Soc. A. 246, 495 (1958). Medidas de Anisotropia Magnética suportam essa visão: MULAY, L.N. ; FOX, S.N.D.M.E. J. Chem. Phys. 38, 760 (1963).

Mas Ferroceno não sofre reação de Diels-Alder. não é uma olefina, é um aromático… atípico, mas é. Veja: NESMEYANOV, Loc. Cit.

Para nosso Grupo de Pesquisa, MILLER, J.; FEDERMAN NETO, A. (1986), o modelo de Fischer é mais adequado. Mas há aproximações mais modernas empregando orbitais moleculares.

Veja FLORIS, B.; ILLUMINATI, G.; JONES, P.E.; ORTAGGI, G. Coord. Chem. Rev. 8, 39 (1972). Veja também RZEPA, H. Blog. Imperial College, Londres Inglaterra (2011). PEREIRA, C.M.P.;  VENSKE, D.; TROSSINI, G.H.G. Quím. Nova 36, 1 (2013).

Estava descoberta a verdadeira estrutura química, sanduíche nos compostos organocromo de Hein, veja acima, Loc. Cit (1919). HEIN, F. ; EINSFELD, K. Zeit. Anorg. Allg. Chem. 292, 162 (1957).

O Químico Alemão Dietmar Seyferth  recentemente falecido de COVID19, revisou a História do Ferroceno, Metalocenos e do Dibenzenocromo. SEYFERTH, D. Organometallics 21 2800 (2002).  Ibid. , 1520 (2002). SEYFERTH, D. Organometallics, 23, 3562 (2004).

Eu também trabalhei com essa reação, trabalhei um pouco com compostos bis(areno)cromo.

Pela Química do Ferroceno, Matalocenos de outros metais e Bis(Areno)cromo e outros bis(areno)metais, e pelas estruturas “sanduíche” ou “duplo cone”, Wikinson e Fischer receberam o prêmio Nobel de Química de 1973.

Por não ser prosaica e  ser ainda bastante  interessante e diferente, a Química do Ferroceno continua a atrair a atenção de pesquisadores no Mundo todo, mesmo após 50, 60 ou mesmo, 70 anos. ASTRUC, D.  Eur. J. Inorg. Chem. 6 (2017).

Revisões, 50 anos:  FEDERMAN NETO, A.; PELEGRINO, A.C.; DARIN, V.A. Trends Organomet. Chem. 4, 147 (2002). 60 anos: WERNER, H. Angew. Chem. Int. Ed. 51, 6052 (2012), REIZE, K,; LANG, H. Organometallics, 32 ,  5623 (2013). 70 anos: TOGNI, A. Chimia, 75, 805 (2021). STEPNICKA, P. Eur. J. Inorg. Chem. 24, e202200388 (2022).

4. SUMÁRIO, CONCLUSÃO E OBSERVAÇÕES :

“In Memorian” de meu Orientador, UFPB,  e antes, UNICAMP e USP. O Químico Inglês Prof. Dr. Joseph Miller, especialista em Substituição Nucleofílica Aromática, outro link, que me guiou nos meus primeiros passos na Ciência e me mostrou o caminho seguro. Nunca esquecerei do senhor e do que me ensinou, serei sempre grato…

Também “In Memorian” de meus amigos que  já se foram, Prof. Dr. João Baptista Sargi Bonilha, Prof. Dr. Eduardo Joachim de Souza Vichi,  Prof. Dr. Arnaldo Bueno Pereira, ex colega de Pós-Graduação e  ex professor da UFPB, e Prof. Dr. Ivan Pérsio de Arruda Campos. Líder de Grupo de Pesquisa, na UNIP.

Este Artigo é uma revisão sobre a História da Química dos Compostos Organometálicos de maneira geral. Ainda, a História da Química do Ferroceno e do Dibenzenocromo, com ênfase em alguns aspectos de sua estrutura e reatividade. Essa é minha  principal Especialidade de Pesquisa, e Tema do meu Doutorado.

Este Artigo foi escrito em computador com sistema operacional Linux e poucas vezes, Windows e as referências bibliográficas obtidas pelos métodos descritos nesse meu antigo Tutorial.

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